Entro no Uber e sou recebido por Roberto Carlos cantando bem alto:
“Como vai você? Eu preciso saber da sua vida.”
Provoco o motorista, elogiando o seu romantismo e perguntando se ele também quer saber da vida de alguém…
Sua resposta é sábia: “a gente fica de olho na vida dos outros e se esquece de ver a nossa.”
Concordei e fiquei pensando quanto tempo gasto fuçando vidas alheias, em detrimento da autorreflexão.
Atuo em pesquisas, há muitos anos. Já perguntamos de tudo a todo tipo de gente.
Ao final da abordagem, tabulamos, analisamos e apresentamos os resultados ao cliente.
Procuramos motivar as empresas a refletirem sobre suas práticas e abordagens ao Mercado, em retribuição aos entrevistados que nos contaram coisas das suas vidas.
Empresas nos abordam a todo momento. Precisam saber da nossa vida.
Entretanto, o retorno desta curiosidade nunca vem rápido nem adequado.
Algumas nos enviam um e-mail de agradecimento.
Bons relacionamentos começam com trocas de informações e evoluem com as transformações causadas por estas trocas.
Eu digo meu nome, você diz o seu.
Eu digo que tenho uma prima com o seu nome. Você diz que sua família é grande.
Eu digo que adoro família. Você conta suas objeções.
E assim avançamos a uma construção de vínculos.
Acontece entre pessoas. Deveria também acontecer entre marcas e seus consumidores.
Aliás, apliquei a fórmula com David, o motorista que me levava para casa.
Elogiei seu carro. Ele me contou que havia acabado de pagar a última parcela.
Perguntei se gostava da marca. Ele me disse que não era a sua preferida, mas era a adequada ao momento.
Adorei a conversa com ele.
A troca de informações é o primeiro anúncio publicitário de quem somos.
Vínculos duradouros se constroem como se constrói uma grande marca: com verdade, consistência e diálogo. Porque ninguém se apaixona por quem se cala.
É na troca — de histórias, ideias, gostos, traumas e piadas — que a conexão se dá.
É quando a gente se abre que o outro encontra espaço para entrar.
Num mundo de relações instantâneas e conversas por emoji, compartilhar informações virou um ato de coragem e generosidade. Quem informa, forma. Quem se comunica, se compromete. Porque quando você diz o que pensa, ouve o que o outro sente. E é aí que nasce o vínculo: entre o que você revela e o que o outro reconhece.
Vínculos duradouros são como grandes campanhas: começam com uma boa ideia, evoluem com escuta ativa e se fortalecem com verdade emocional.
Porque ninguém esquece de quem fez a gente pensar, sentir e querer continuar ouvindo.
Mesmo que seja Roberto Carlos.
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